domingo, 9 de dezembro de 2012

Fazenda que receberá fiéis durante visita do Papa é uma fábrica de locomotivas de Guaratiba

09/12/2012 - O Globo

Espaço tem ferrovia particular e mão de obra especializada em construir marias-fumaças

RIO - O ano é 1982 e a máquina está encostada num canto da Companhia Açucareira Usina Barcelos, em Campos. Com 22 toneladas, o veículo foi fabricado na Pensilvânia, nos Estados Unidos. Trata-se de um exemplar da Baldwin Locomotive Works, empresa de excelência na fabricação de trens a vapor no início do século XX. Ao ver a relíquia inutilizada, o empresário Márcio Manela decide negociar com o dono da usina. Para sua surpresa, a resposta positiva vem rápida: "Pesa essa máquina para o moço como se fosse apenas ferro". Com peças de cobre, a locomotiva é arrematada a preço de sucata.

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A locomotiva e o Papa
Trinta anos depois, a "número 3", menina dos olhos de Márcio, roda na ferrovia particular do empresário, em Guaratiba. Ele é um dos acionistas da Fazenda Mato Alto, a mesma que ficará abarrotada de fiéis durante a missa campal do Papa Bento XVI, em julho do ano que vem, quando acontecerá a Jornada Mundial da Juventude.
— Trouxemos a maria-fumaça para Guaratiba e aos poucos fomos montando os trilhos, comprando um pedacinho aqui, outro acolá. Depois de sair dos EUA, a locomotiva foi levada para a Usina Taí, em Campos, antes de ir para a Usina Barcelos. Eu sou apenas o terceiro dono. E último — gaba-se Márcio.
Além de abrigar a ferrovia particular de 3,8 quilômetros de extensão, a Fazenda Mato Alto é uma oficina de locomotivas. Os trabalhos são feitos pelo trio Isael Somer, Pedro Mariano da Silva e Alayson Rodrigues, funcionários que também ajudam a cuidar das 700 cabeças de gado — que de fato garantem o sustento da propriedade às margens da Avenida das Américas. No fim dos anos 90, eles reformaram uma locomotiva a pedido de um empresário de Paraíba do Sul. Quatro anos depois, outra máquina azeitada pelo trio foi levada para Viana, Espírito Santo.
— Elas ficam aqui até alguém resolver comprar — comenta Isael, nascido há 62 anos em Pádua, olhando para a "número 89", novinha em folha, estacionada. — Compramos as chapas lisas e fazemos todo o serviço aqui. Eu fui soldador naval, então aprendi muito do ofício. Só a caldeira, que exige uma mão de obra mais especializada, nós mandamos para uma empresa de Campo Grande fazer.
As marias-fumaças percorrem a fazenda à velocidade máxima de 30km/h. O cenário é tão inusitado que já serviu de pano de fundo de telenovelas como "Sinhá Moça", "Cabocla" e "Araguaia". Márcio Manela é evasivo ao falar sobre o valor de mercado das suas "filhas".
— É mais ou menos o preço de um carrão de luxo, mas tudo é negociável — diz, sem jeito. — Só queremos ter margem de lucro para comprar a próxima sucata e restaurar. É puro hobby. Uns gostam de cavalo... eu gosto de trem.
E o Papa, poderá dar uma voltinha de trem? Márcio trata de pôr panos frios em qualquer pretensão:
— Nesse dia, não vou poder liberar. A fazenda vai estar lotada. Elas vão ficar guardadas na casinha.

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